Pedi ao chatbot para interpretar o Sermão do Monte. Veja os erros exegéticos que a IA cometeu.
Nos últimos meses, tem sido difícil escapar da discussão sobre a inteligência artificial ou, mais especificamente, sobre o ChatGPT e uma série de outros chatbots desenvolvidos por empresas de tecnologia. Com base na popularidade do tópico (e no tom geralmente fatalista), no meio acadêmico e nos relatórios de tecnologia, decidi que eu precisava ver o que o ChatGPT tem a dizer sobre a Bíblia.
Mais especificamente, eu queria explorar como o ChatGPT interpreta o Sermão do Monte. Fiz isso pelo bem dos jovens universitários que oriento — em especial, porque nosso grupo está convencido de que o sermão deve ser seguido e estamos comprometidos em vivê-lo em nossa vida cotidiana.
Em minhas interações com o chatbot, fiquei impressionado com o fato de que o ChatGPT é como um espelho para a igreja norte-americana, bem como para a comunidade acadêmica ocidental mais ampla, pois compartilha conosco três grandes deficiências, à medida que somos moldados pelo espírito da nossa era:
Primeiro, o ChatGPT cria metáforas e individualizações das Escrituras sem um método claro de quando e por que o faz, sem justificativa e, muitas vezes, entrando em contradição direta com o próprio texto. Em segundo lugar, as interpretações do chatbot ignoram as tradições interpretativas das quais provêm. Em terceiro lugar, pelo fato de o chatbot ser algo desencarnado, suas interpretações são necessariamente desencarnadas — e, portanto, um bot é incapaz de reconhecer as realidades das Escrituras e da interpretação. Cada uma das tendências acima, presentes nas respostas da IA é, de alguma forma, um reflexo de deficiências históricas em nossa própria interpretação humana.
Quando perguntei ao ChatGPT "Como devemos interpretar o Sermão do Monte?", o chatbot disparou uma definição já esperada, que incluía estas palavras: "Muitas pessoas interpretam o Sermão do Monte como um modelo para viver uma vida boa e significativa, e também um guia de como tratar os outros". E concluiu sua resposta com a seguinte observação: "Em última análise, como o Sermão do Monte é interpretado dependerá das crenças e dos valores pessoais do indivíduo".
Quando perguntei a ele: "E como você interpreta isso?" O ChatGPT respondeu: "Como sou um modelo de linguagem grande, treinado pela OpenAI, não tenho crenças nem valores pessoais, portanto, não posso oferecer minha própria interpretação do Sermão do Monte. Fui projetado para fornecer informações gerais e responder a perguntas da melhor maneira possível, com base nas informações e nos conhecimentos com os quais fui treinado. Não sou capaz de proferir opiniões nem interpretações pessoais."
Mas logo ficou claro que, quando eram feitas as perguntas certas, o ChatGPT realmente interpretaria o Sermão do Monte, seja fornecendo uma interpretação específica ou oferecendo várias interpretações e julgando entre elas, embora não explicasse seu método de interpretação.
Por exemplo, quando questionado sobre os ensinamentos de Jesus, em Mateus 5.29-30 ("Se o teu olho direito te faz tropeçar…"), o ChatGPT respondeu: "É importante perceber que esta passagem não deve ser interpretada literalmente. Jesus está usando linguagem figurada para enfatizar a gravidade do pecado e a importância de evitá-lo. Ele não está literalmente instruindo seus seguidores a mutilarem seus corpos para evitar o pecado”. Não é que eu necessariamente discorde dessa afirmação, mas fiquei impressionado com a firmeza e a certeza que ela expressou, quando apenas duas perguntas antes dessa o chatbot tinha me dito que não era capaz de interpretar o sermão.
Quanto mais eu explorava ensinamentos específicos com o ChatGPT, mais ele parecia se inclinar para uma interpretação metafórica dos ensinamentos de Jesus. Então, finalmente lhe perguntei se poderia haver algum ensinamento específico na passagem que deveria ser interpretado literalmente. E aqui está a resposta do ChatGPT:
É difícil dizer com certeza onde, no Sermão do Monte, Jesus fala literalmente, pois o uso de linguagem figurada na Bíblia é complexo e frequentemente debatido. O Sermão do Monte […] contém muitos exemplos de linguagem figurada. Em geral, a Bíblia costuma usar linguagem figurada para ilustrar um conceito ou para enfatizar um ponto, e nem sempre fica claro se uma passagem específica deve ser entendida de forma literal ou figurada.
Um exemplo possível [...] de uma passagem em que Jesus fala literalmente é Mateus 5.38-39, onde ele diz: "Vocês ouviram o que foi dito: 'Olho por olho e dente por dente'. Mas eu lhes digo: Não resistam ao perverso. Se alguém o ferir na face direita, ofereça-lhe também a outra". Nesta passagem, Jesus cita um provérbio bem conhecido, "olho por olho e dente por dente", e, então, oferece seu próprio ensinamento sobre como responder à violência e à agressão.
Ele não está usando linguagem figurada, mas está oferecendo uma instrução clara e direta sobre como seus seguidores devem responder a tais situações. No entanto, é importante observar que esta é apenas uma interpretação possível desta passagem, e pode haver outras maneiras de entendê-la.
Mas, à medida que continuei a pressioná-lo sobre esses ensinamentos específicos, o chatbot acabou alegando que qualquer um que interprete literalmente os ensinamentos de Jesus sobre a não-violência é "alguém com uma visão de Poliana" [uma pessoa extremamente otimista e ingênua]. Quando o questionei sobre essa afirmação, ele recuou e se desculpou. No entanto, continuou a manter sua cautela quanto a interpretar literalmente este e outros ensinamentos do Sermão do Monte. (Dois exemplos adicionais disso são que Mateus 5.32 não proíbe o divórcio, mas simplesmente valoriza o casamento, e que Mateus 5.22 não trata realmente de alguém estar correndo o risco de ir para o inferno, mas enfatiza a gravidade da ira).
À medida que eu questionava seu processo para chegar a essas interpretações, o ChatGPT dizia que seu entendimento da Bíblia vinha de seu treinamento, que, por sua vez, baseara-se em "um grande número de textos", entre os quais estavam versões bíblicas e literatura sobre a Bíblia, embora não seja capaz de identificá-los. (Ele é capaz de fazer e de fato faz referência a versões específicas, mas não confirma se elas foram usadas em seu treinamento). Ele também afirmou que suas alegações são baseadas na "mensagem mais ampla da Bíblia" — e quando o questionei sobre de onde veio essa estrutura interpretativa, o ChatGPT invocou principalmente os escritos de Paulo como instrumento para refinar os ensinamentos de Jesus no Sermão do Monte.
Fonte: Cristianismo Hoje
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Pastor Carlos Roberto Silva
Point Rhema